Seria possível transformar a demora na análise dos requerimentos feitos no INSS em indeferimentos “tácitos”?
Em nosso artigo anterior, escrevemos sobre a demora na análise dos benefícios previdenciários (INSS) e o que poderia ser feito, para que a Administração Pública analisasse estes requerimentos, mediante ordem judicial.
Agora, alongando o tema um pouquinho, vamos tratar a respeito de um outro assunto.
Pois bem.
Todos nós sabemos que o INSS, não de hoje, vem demorando excessivamente na análise de qualquer requerimento feito pelos cidadãos brasileiros (ou estrangeiros).
Entretanto, a dúvida que surge na cabeça de nós juristas é a seguinte: seria possível, ciente desta demorada EXCESSIVA, utilizar a ausência de decisão ou conclusão do processo administrativo como um INDEFERIMENTO TÁCITO?
Bom, inicialmente, precisamos esclarecer sobre a necessidade deste “indeferimento”.
Para que o poder judiciário não ficasse assoberbado e abarrotado de pedidos previdenciários, firmou-se a jurisprudência (decisões) no sentido de que, resumidamente, o cidadão DEVERIA, obrigatoriamente, passar pelo INSS (realizar requerimento administrativo), para, somente com a negativa (ainda que parcial) do órgão previdenciário, ingressasse com sua respectiva ação judicial.
Para ficar mais claro ao leitor, sugerimos uma lida detalhada no Recurso Extraordinário com Repercussão Geral nº 631240/MG, acórdão (decisão) este que delimita e regulamenta exatamente essa matéria e, ainda, prescreve eventuais casos em que o Segurado poderia ingressar DIRETAMENTE no poder judiciário, sem, contudo, passar pela via administrativa.
Hoje, não vamos nos ater a essas exceções (extremamente importantes e práticas no dia a dia), mas tomaremos por base a regra geral, qual seja, necessidade de passar pelo INSS (requerimento de concessão) e ter uma resposta do órgão previdenciário.
Então, vamos para análise do caso.
Primeiramente, devemos estar cientes que os requerimentos de benefícios no âmbito do INSS estão vinculados a Lei Federal n.9784/1999 (Lei dos processos administrativos no âmbito federal).
Quanto ao prazo para a resposta, assim definiu o Legislador:
Art. 49. Concluída a instrução de processo administrativo, a Administração tem o prazo de até trinta dias para decidir, salvo prorrogação por igual período expressamente motivada.
Em outras palavras, a Administração Pública teria o dever de responder e concluir o processo administrativo em 30 (trinta) dias, sendo tolerado uma prorrogação de igual prazo.
Ou seja, poder-se-ia falar em 60 (sessenta) dias para uma eventual conclusão do processo administrativo.
Então, seria possível utiliza-se do escoamento deste prazo, para, assim, fundamentar que ocorreu um indeferimento tácito (“fictício).
A resposta é sim!
O fundamento básico, assemelhasse ao descrito no texto anterior (https://zurita.jusbrasil.com.br/artigos/802506960/a-demora-excessiva-na-analise-dos-benefícios-pelo-insseo-que-pode-ser-feito-pelo-poder-judiciario), uma vez que se consistem no descumprimento do artigo já citado (Artigo 49), bem como a ausência de decisão em prazo razoável, ferindo o disposto no Artigo 48 da mesma Lei e artigo 41, § 6º, da Lei nº 8.213/91.
Novamente, o artigo 5º, inciso LXXVII, da Constituição Federal entra em cena:
“a todos, no âmbito judicial e administrativo, são assegurados a razoável duração do processo e os meios que garantam a celeridade de sua tramitação.”
Quanto as recentes decisões, o TRF da 4ª Região (5ª e 6ª turma) vem entendendo dessa forma:
PREVIDENCIÁRIO. REVISÃO DE APOSENTADORIA. CONCLUSÃO DO PROCESSO ADMINISTRATIVO. DEMORA DO INSS. INDEFERIMENTO TÁCITO. PETIÇÃO INICIAL. RECEBIMENTO. RETORNO DOS AUTOS À ORIGEM PARA PROSSEGUIMENTO. 1. O prazo para análise e decisão em processo administrativo submete-se ao direito fundamental à razoável duração do processo e à celeridade de sua tramitação, nos termos do art. 5º, LXXVII, da CF/88. 2. A demora no processamento e conclusão de pedido administrativo equipara-se a seu próprio indeferimento, tendo em vista os prejuízos causados ao administrado, decorrentes do decurso de tempo. 3. Comprovado o excesso injustificado na conclusão do processo administrativo resta caracterizada a pretensão resistida, devendo ser recebida a petição inicial. 4. Provido o recurso para determinar o retorno dos autos à origem e o regular prosseguimento do feito. – AC 0024572-90.2013.4.04.9999, Rel. Marina Vasques Duarte de Barros Falcão, D.E. 07/03/2017. E mais recente: AI nº 5036980-42.2019.4.04.0000, j. em 20/11/19. É como adoto. Nestas condições, defiro o pedido de antecipação dos efeitos da tutela recursal. Comunique-se ao Juízo de origem. Intime-se a parte agravada. Após, voltem conclusos.
EMENTA: PREVIDENCIÁRIO. MANDADO DE SEGURANÇA. CONCLUSÃO DO PEDIDO DE CONCESSÃO/REVISÃO DO BENEFÍCIO. PRAZO RAZOÁVEL PARA ANÁLISE DO PEDIDO. A demora excessiva na análise do pedido de concessão/revisão do benefício previdenciário, para a qual não se verifica nenhuma justificativa plausível para a conclusão do procedimento, não se mostra em consonância com a duração razoável do processo, tampouco está de acordo com as disposições administrativas acerca do prazo para atendimento dos segurados (TRF4, AC 5002088-84.2019.4.04.7121, SEXTA TURMA, Relator JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA, juntado aos autos em 05/09/2019)
O TRF da 5ª região também possui entendimento semelhante[1], assim como o TRF da 3ª região[2].
Tal entendimento reforça a ideia, de que a demora na análise configura o interesse de agir processual, dando possibilidade ao cidadão ingressar com seu pedido na justiça.
Não podemos deixar passar, que tal entendimento não é pacífico, como exemplo citamos a decisão da turma suplementar do Paraná (órgão especial do TRF4):
DECISÃO: Trata-se de agravo de instrumento, com pedido de efeito suspensivo, interposto contra decisão que indeferiu pedido de reconsideração para que fosse dado prosseguimento ao feito (ev. 1, doc. 2, fl. 124). Relata que o Juízo entendeu pela necessidade do agravante em formular pedido administrativo ao INSS a fim de que fosse analisada a possibilidade de reconhecimento da especialidade dos períodos de 07/04/1982 a 30/06/1991 e 01/07/1991 a 03/04/1995, determinando o sobrestamento do feito pelo prazo máximo de 60 (sessenta) dias. Diz que o agravante protocolou em 29/05/2019, junto à Agência da Previdência Social o pedido. Entretanto, até o momento ainda não foi analisado, razão pela qual postulou pelo prosseguimento do feito. Alega que o agravante não pode ser prejudicado pela demora na análise do procedimento administrativo e que a demora na entrega da análise, equivale ao indeferimento do procedimento administrativo. Argumenta, ainda, que é notório o indeferimento do INSS quanto aos pedidos de averbação e reconhecimento da especialidade. Requer seja deferido efeito ativo. É o relatório. (…) Por outro lado, se negado o pedido, estará caracterizado o interesse de agir e o feito deverá prosseguir. Em qualquer caso, a análise quanto à subsistência da necessidade do provimento jurisdicional deverá ser feita pelo Juiz. Portanto, se ainda não apreciado o pedido administrativo, não há pretensão resistida, carecendo a parte autora de interesse processual, razão pela qual, correta a decisão agravada que manteve a suspensão feito. Ante o exposto, indefiro o pedido de efeito suspensivo. Intimem-se, sendo a parte agravada para apresentar resposta, querendo. (TRF4, AG 5039113-57.2019.4.04.0000, TURMA REGIONAL SUPLEMENTAR DO PR, Relator MÁRCIO ANTÔNIO ROCHA, juntado aos autos em 20/10/2019).
Logo, é possível ao cidadão ingressar com a medida judicial, equiparando o decurso de prazo para a análise de seu requerimento administrativo com um INDEFERIMENTO TÁCITO.
Agora, não podemos deixar de esclarecer, que não são todos os casos em que seria possível utilizar tal fundamentação, sendo correto a procura por um profissional da área, a fim de avaliar o caso, bem como o prazo e documentos acostados no processo administrativo.
Juntos somos mais fortes!
[1] Tribunal Regional Federal da 5ª Região TRF-5 – EDAC : Embargos de Declaração na Apelação Civel – 0000440292019405999902
[2] Tribunal Regional Federal da 3ª Região TRF-3 – RECURSO INOMINADO : RI 00011341020194036327 SP